sábado, 4 de agosto de 2012

NOMEDACOUSA ENTREVISTA | TUANE EGGERS




















O sono chega como um barco pelas costas, e para partir é necessário estar desatento, pois se você olhar o barco, perde a viagem, cai em seco, tomba onde você já está. Essa frase do livro Estorvo, de Chico Buarque, serve exatamente para descrever o efeito que bate acompanhar o trabalho da fotógrafa gaúcha Tuane Eggers. Tuane nasceu em Lajeado sob o signo de escorpião, tem 22 anos, e é lá que ainda vive e trabalha erguendo um mundo em suas fotografias. Um pedaço desse mundo foi imortalizado na película Os Famosos e os Duendes da Morte, em que ela participa como atriz e tem algumas de suas fotos exibidas. Dois casos diferentes e complementares já me ocorreram ao ver suas fotos. Um: ela tem uma foto em que um arranjo de flores serve como comida em um prato onde alguém segura um garfo e uma faca pronto para devorar o banquete. Acontece que após ver essa foto, na mesma noite, sonhei com ela, que eu ia à um restaurante e no cardápio só tinham flores. Dois: o contrário do primeiro, sonhei que cuspia pássaros, ou que pássaros moravam na minha boca, e logo mais vi que a Tuane tinha uma foto com imagem semelhante. O mundo dos sonhos se enriquece nas fotos da Tuane. Inclusive, ela está presente em muitas das fotos. Alguns ensaios são autoretratos, mas ela está presente mais como performer do que como modelo - embora seja linda, não é a sua beleza que ela está retratando, e sim a sua imersão em seu próprio universo. O universo de uma realidade que pode virar sonho e vice-versa.




É fácil identificar em seu trabalho uma visão autoral e a construção de um olhar. Como você define essa marca?
Acredito que ao longo desses anos fui criando uma estética, um cenário, uma combinação de cores. Talvez pela própria repetição. Das cores, dos temas, desse olhar imagético. Utilizo muito o quintal da minha casa como cenário, principalmente nos autorretratos, e talvez isso tenha ajudado a criar essa aura de autoralidade.

O que te influencia e te inspira? Quais as influências da sua origem em seu trabalho?
Talvez a minha cidade tenha me influenciado a buscar essa fuga na fotografia. Por não me identificar com muitas coisas reais que estavam ao meu alcance, fui criando esse mundo imaginário, com alguns elementos diferentes. Mas essa maluquice pode ser real, se a metáfora for compreendida. Gosto de mesclar o real e o imaginário. Gosto de perceber e mostrar a poesia nas coisas invisíveis. Principalmente a poesia que existe na natureza e no mundo ao nosso redor - que de tão velozes, muitas vezes não percebemos.

Que equipamento usa?
Uso duas câmeras digitais, uma Canon Rebel XTI e outra Nikon D90. De um tempo pra cá também tenho me arriscado mais na fotografia analógica e estou gostando da experiência. É uma aventura nostálgica.







Nessa época da internet há uma poluição de imagens, vemos e consumimos milhares de imagens por dia. Não lhe parece que a fotografia está banalizada?
Acredito que essa seja mesmo uma era imagética, que acompanha uma necessidade desesperada de se mostrar - ou ao menos, mostrar a sua melhor parte. Pode ser que a fotografia esteja mesmo banalizada pelo turbilhão de imagens que nos chegam todos os dias. Porém, no meio delas, também existem muitas coisas boas, cheias de um sentido maior que o cotidiano. O negócio é saber diferenciar e ver onde está a poesia real nisso tudo. Porque a poesia, muitas vezes, está bem no meio do banal.


Também percebo em suas fotos uma poesia onírica e simbolista. Além disso há sua ligação com a natureza. Entretanto, você está estudando jornalismo e vai dar de cara com tudo o que não é sonho.Tem dias que eu mesma me pergunto: Jornalismo? É um grande paradoxo, porque eu gosto muito dessa coisa de sonho e de mundos imaginários. Ao mesmo tempo, não sou insensível às coisas duras da realidade e eu sinto vontade de modificá-las, mas ainda não sei bem de que forma. Sinto que essa vontade de sonho pode ser justamente a ferramenta para o início.


E projetos futuros?Confesso que não sou uma pessoa que saiba fazer projetos. Talvez o meu projeto seja justamente não ter projetos.




Além de fotografias, que outro tipo de arte te inspira? O que você ouve, assiste, lê?
Gosto muito de música, de cinema e de literatura - mas, principalmente de música. Não consigo passar um dia sem ouvir uma música que me toque fundo, e acredito que essa seja uma das artes mais puras. Mas, por mais que eu goste, sei que ainda tenho muito a aprender sobre todas essas coisas, e esse também é um tipo de inspiração. Os sons que me habitam são de várias épocas. Gosto desde os mais especiais dos anos 60 e 70 (como Velvet e a musa Nico, Bowie, Beatles, Dylan, Joni Mitchell) até os mais atuais (como Cat Power, Bon Iver, Air, Devendra, Beach House, entre tantos outros). Sem esquecer os brasileiros, ultimamente tenho ouvido bastante Caetano e a leitura atual é dele também, o Verdade Tropical.


Se você pudesse escolher um lugar para ir agora e imediatamente, que lugar seria?
Não sei, ainda tenho muito desse mundo para conhecer. Um lugar que sinto muita vontade de conhecer é a Islândia, por exemplo. Outras vezes também sinto vontade de desaparecer temporariamente dentro de uma bolha de sabão ou de simplesmente me desintegrar, solta no ar, talvez seja um bom lugar para morar.






Mais fotos em seu perfil no Flickr

5 comentários:

  1. Acho a Tuane linda demais, as fotos dela dá muito inspiração pra mim. Adoro o trabalho dela no "os famosos e os duendes da morte" e acho que Nescafé do Apanhador Só ficou mais lindo com a presença dela.

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  2. Olhar suas fotos é quase como entrar em um universo paralelo.
    É como se ela fotografasse o que eu gostaria que fosse a realidade. Mesmo distorcida, mesmo de papel celofane. Mesmo assim. E assim mesmo.

    Gosto muito do trabalho dela.
    E adorei a entrevista.

    Sucesso para vocês.
    Abraços.

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  3. Lomografia da mais altíssima qualidade, ao mesmo tempo em que mergulha na dimensão da fotografia de arte, pelo alto teor estético.Onirismo a flor da pele, a flor da alma. Bravíssimo!

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